terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Cap. 10 - Head Above Water

Os trovões pararam de agitar a casa e logo a chuva também cessou, um silêncio mortal baixou sobre a casa. Bruna olhava para a estranha figura em pé diante dela, um guerreiro nórdico enquanto ele também a encarava, curioso. Enquanto isso Sarah estava de pé, a meio caminho dos dois, apesar do silêncio havia uma certa tensão na casa, um desconhecimento.
- Odin... - Bruna começou a falar - Odin como o deus nórdico?
- É um jeito de ver as coisas. - Odin respondeu.
- Acho melhor todos nos sentarmos - Foi a vez de Sarah falar - farei um chá para todos.
Bruna puxou uma cadeira e sentou, seguida por Odin, eles ainda se encaravam. Bruna olhou para os estragos na casa, para a roupa suja de sangue, então voltou os olhos para a mãe morta sobre a cama da mestra e novamente olhou para Odin.
- Ele morreu? - Ela perguntou
- Asmodeus?
- Sim. Ele morreu? - Ela perguntou novamente.
- Eu o bani temporariamente. Mas ele pode voltar, podem demorar semanas ou anos, não sei com que velocidade ele poderá se regenerar no inferno.
Bruna então sorriu, bateu a mão na mesa e sorriu novamente.
- Por que está rindo? - Odin estava curioso.
- Porque eu mesma quero ter o prazer de matá-lo. Pela minha mãe, pelo meu pai, pela minha irmã... Eu mesma devo matá-lo.
Foi a vez de Odin rir. O ódio da garota o divertia, ele era um elemental temperamental, nada mais que o esperado para o senhor dos trovões, pai das tempestades e divindade nórdica. Ele colocou sua espada em cima da mesa e empurrou para Bruna.
- Considere isso um presente. Use-a para matar Asmodeus e qualquer outro ser que te faça mal. Uma estocada no coração destruirá ele, para sempre.
Bruna olhou para a espada, pegou pelo cabo, mas não tinha destreza para manejá-la, era pesada. Ela nunca soube lutar, seria complicado aprender de uma hora para outra.
- Eu não sei lutar.
- Eu posso lhe ensinar.
A conversa seguiu sem grandes acontecimentos. Bruna continuou perguntando sobre o manejo de espadas e Odin falava sobre como usá-las, contava histórias sobre batalhas, muito anteriores ao surgimento do mundo moderno. Era quase surreal a cena, sentados à mesa, falando sobre trivialidades enquanto a mãe da garota estava morta no quarto e os miolos de Asmodeus se espalhavam pela sala. Sarah voltou com o chá e ofereceu uma xícara para cada um.
- O que você é? - Bruna perguntou para Odin - Anjo?
- Não, graças ao Pai que não. Sou um elemental, uma divindade da natureza.
- O que isso quer dizer?
- Sou a personificação de algo que você pode ver na natureza. Tudo é. Existem mais criaturas neste mundo além de anjos e demônios minha criança. Eu e você somos uma delas.
- O que quer dizer com "eu e você"? Eu sou apenas uma humana. - Bruna teve um sobressalto.
Odin contou uma longa história, uma história sobre o surgimento do mundo e o oitavo dia. Então contou sobre as batalhas ancestrais entre elementais e demônios, contou sobre como essas divindades viviam longe dos olhares angélicos, falou sobre a história de Gaia e Emanuel. Contou sobre as novas políticas angelicais e sobre a guerra no céu. Histórias tão fantásticas que se não fossem as últimas 48 horas da vida de Bruna ela jamais teria acreditado e ainda assim ela tinha seus receios. Mas era impossível negar, o que ela viu naquela noite... Só podia ser real.
- Por que eu? O que eu tenho a ver com toda essa guerra, com anjos, demônios e elementais? Eu sou só uma garota normal! - Bruna ainda não acreditava.
- Lembra o que falei sobre o amor proibido entre Emanuel e Gaia e o modo como eles tiveram filhos?
- Lembro.
- Os filhos dos imortais foram tornados estéreis por ordem de Deus. Primeiro ele tornou as próprias divindades estéreis, anjos e elementais. Por fim os filhos deles foram proibidos de se relacionar com humanos a fim de procriarem, aquele que desobedecesse seria morto. Mas como você pode imaginar, isso não se sucedeu muito bem. Alguns foram escondidos, outros fugiram, mas a verdade é que muitos geraram descendentes. E você, minha criança, você é uma dessas descendentes. Mas não uma qualquer, é descendente direto do primeiro casal imortal: Gaia e Emanuel.
- O que você quer dizer? Isso é impossível.
- Você viu o que fez no incêndio não foi? Você viu como conjurou aquelas chamas, aquele poder não pode ser usado por qualquer humano. Deve-se ter algo a mais e você tem! Você é de fato a humana mais poderosa deste planeta. Mesmo após milênios de misturas com humanos, você ainda preserva a essência primordial e é isso o que a torna tão poderosa e tão perigosa.
- O que quer dizer?
- Uma batalha se aproxima garota, uma batalha que decidirá o futuro do mundo conhecido e de todos os seres deste universo e de outros além deste. E você... Você é a chave para essa batalha, sua essência é a chave. Por isso os demônios a querem, pois com ela Lúcifer atingirá os céus e conquistará ele. Por isso nós, os elementais devemos protegê-la. Por isso a escondemos dos próprios anjos, pois se eles possuírem um poder tão grande, nas mãos erradas poderia ser ainda pior.
- Estou cansada de fugir e me esconder, estou cansada de ter que depender de outros, de ver minha família morrer. Chega! Se é tão importante assim que eu viva, me ensine a lutar pela minha própria sobrevivência.
- Isso demandaria tempo, não sei se o temos. Fui enviado aqui para protegê-la, não para deixá-la se virar sozinha.... - Odin disse.
- Mas...
- Eu a treinarei tio. - Sarah disse olhando firmemente para Odin.
- Como? - Ambos olharam para a ruiva.
- Ela é minha discípula, está no meio do caminho para se tornar wicca. Com um pouco de tempo posso treiná-la, ela tem potencial e seria de grande ajuda na batalha que está por vir se puder lutar e usar suas habilidade. Precisamos de todas forças que temos para deter Lúcifer.
- Quanto tempo? - Odin perguntou.
- Três anos, é tudo o que eu preciso.
- Acho que posso levar isso ao conselho. - Ele coçou a barba - Logo se vê que é descendente de Volcano! A determinação é uma chama que nunca morre. - Então Odin começou a rir.
- Descendente de Volcano? - Bruna perguntou.
- Sim, o senhor das chamas, dos vulcões, a divindade que pode destruir e construir... Acha que meus cabelos ruivos são a toa? - Sarah riu.
- Somos primas então?
- Pode apostar que sim. - Sarah falou sorrindo.
Bruna se permitiu rir, sua família havia sido destruída, havia perdido o que tinha de mais importante para si, mas começava a ver que não perdera somente algumas coisas... mas ganhara outras também. Estava ganhando uma nova família, estava ganhando a chance de se vingar. E isso já lhe dava forças suficiente para seguir em frente.
Os três presentes se olharam e sorriram, as coisas estavam prestes a mudar.

Enquanto os bombeiros terminavam de apagr o fogo da casa, um grupo de paramédicos saía dela com uma maca. Deitada sobre ela o corpo de uma adolescente, 15 anos talves, parcialmente queimado. O pulso estava fraco, os batimentos iam se desacelerando, não havia esperanças de que sobrevivesse.
Então houve silêncio, os batimentos pararam. Durante 3 minutos tentaram ressuscitá-la, mas de nada adiantou, estava morta, não havia esperança, não havia mais nada.
- Hora da morte três e quinze. - Um médico falou, fechou as portas da ambulância e saiu.
Apenas uma paramédica continuava ali, sentada olhando para o corpo. Ela sorria, sabia que ainda havia esperança, podia escutar o quase inaudível som de uma leve contração cardíaca, a garota só precisava do estimulante certo.
A paramédica tinha longos cabelos pretos que caíam nas costas, um sorriso demoníaco dançou em seus lábios.
- Então eu não faço nada certo? - Lilith falou - Vamos ver o que acha disso Asmodeus.
Ela pegou um pequeno bisturi e cortou um dos seus próprios pulsos e enquanto via o sangue escorrer ela deixou as gotas caírem na boca da garota quase morta. Gota a gota os olhos de Lilith brilhavam de uma forma demoníaca.
Então seguiram-se espasmos no corpo da adolescente deitada na maca, os batimentos ficaram mais fortes. Ela abriu os olhos, sua íris estava vermelha como sangue, uma escuridão havia se apossado da garota, um brilho demoníaco surgiu no fundo da alma daquela garota, ela não sabia onde estava, não sabia quem era a mulher na sua frente... Não conseguia se lembrar, só sabia que precisava de mais daquele sangue.
Lilith sorriu novamente, quase gargalhou.
- Bem vinda de volta, Natalie.














Continua...................................................................

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Cap.9 - You Win or You Die

Cabo Frio - Dias Atuais

O monza estacionou sobre a grama de um velho chalé na beira da praia. Um vento frio soprava sobre o lugar, as nuvens negras cobriam o céu, tapavam as estrelas. Do carro desceram uma mulher ruiva carregando uma outra mulher mais velha com uma mancha de sangue nas roupas, com os cabelos e as mãos queimadas, atrás dela saía correndo uma garota, chorando. As três entraram na casa, a ruiva deitou a mulher ferida sobre sua cama e gritou ordens para a garota, pedidos específicos, pedidos para uma conjuração que não deveria ser feita, uma magia proibida entre as wiccas com sérias consequências a quem a usasse.
A garota rapidamente trouxe tudo para sua mestra, conhecia o lugar, fora ali que poucos meses antes começara sua iniciação, era tudo tão diferente naquela época e naquele exato momento a garota daria sua vida por momentos como aquele novamente. A mulher olhou dentro dos olhos da jovem garota e parou de arrumar os objetos para realizar a conjuração.
- Mestra! Continue! Por favor, continue... - as lágrimas voltaram a correr pelos olhos da garota.
- Já não há mais nada a fazer. - A ruiva abaixou a cabeça - Sua mãe está muito ferida Bruna, ainda que o feitiço funcione, ela ainda estaria às portas da morte. Tudo o que eu faria seria dar alguns minutos a você e a ela, mas não posso trazer ela de volta.
Bruna ajoelhou aos pés da cama, as lágrimas correndo pelo seu rosto. Abraçou o corpo inerte de sua mãe bem junto ao seu, já não se importava se estava suja de sangue ou de terra, queria apenas ficar ali. A ruiva saiu do quarto, já não havia nada a fazer, já não havia porque ela continuar ali.
- Mãe, me perdoa! Eu nunca deveria ter saído, nunca deveria ter deixado você e Natalie sozinhas, me perdoa... Eu te amo mãe, eu sempre vou te amar. - Bruna falava aos soluços.
Então ela sentiu uma leve pressão nos seus dedos, era a mão de sua mãe que chamava sua atenção para ela. Martha tentava abrir os olhos, mas este simples esforço já sugava sua energia restante.
- Não fale mãe... descanse. - Bruna tentava mentir para si mesma e para mãe, queria acreditar que iria ficar tudo bem.
- Filha... não é culpa sua... Por favor... sua irmã... - Martha tentava fazer as palavras saírem de sua boca, mas era inútil, ela só sentia o gosto do sangue.
- Mãe.
Bruna puxou Martha para junto de si, como se naquele abraço pudesse segurar a alma da mãe em seu corpo.
- Eu sempre vou te amar filha...
- Eu sempre vou te amar mãe.
As últimas palavras saíram como um suspiro e Martha então fechou seus olhos e a cabeça caiu para trás. Ela já não estava ali, somente o corpo sem vida, somente a carne. Um trovão soou ao fundo e fez as janelas do quarto tremerem.
Algum tempo se passou, poderiam ser minutos, horas, não fazia diferença. A mestra surgiu na porta do quarto com uma caneca de chá quente. Ela acreditava que aquilo faria Bruna sentir-se um pouco melhor.
- Beba Bruna.
- Eu não preciso disso, Sarah, minha mãe precisa de mim, não posso deixar ela agora.
- Ela já se foi Bruna, ela já se foi.
- Não!
Sarah ajoelhou ao lado de Bruna e a abraçou, ela podia sentir a dor da pupila, podia sentir o medo, a fúria, tudo, ela sabia como era aquela dor, sabia a dor de perder tudo aquilo que amava. Bruna apoiou o corpo da mãe e abraçou Sarah com todas as suas forças.
- Vai ficar tudo bem minha criança, vai ficar tudo bem.
- Por que, mestra? Por que?
Um novo trovão ribombou do lado de fora da casa, agitando novamente as paredes. A porta da sala abriu de sopetão deixando o vento frio e a chuva fina entrarem na casa. Na porta, parado de pé estava o anjo caído, o destruidor, Asmodeus.
- Espero não estar interrompendo nada. - Ele sorriu - Sabe ruivinha, você realmente me machucou quando me jogou no fogo, me desculpe se eu devolver 100 vezes mais, ok?
Sarah levantou e colocou-se na frente de Bruna, já bastava de mortes por aquela noite. Ela começou a conjurar um feitiço, mas mal teve tempo de começar a falar, Asmodeus havia sido mais rápido e suas mãos estavam agarrando o pescoço da ruiva prendendo ela na parede.
- Chega de feitiços por hoje, bruxa.
Bruna se levantou, pegou a pequena bandeja no chão que serviria para o feitiço da mãe e bateu com força na nuca do demôni fazendo ele soltar Sarah.
- Chega! - Bruna gritou.
Asmodeus recuou um passo, sua cabeça agora latejava. Sarah caiu no chão com a respiração ofegante enquanto Bruna recuava, agora que o demônio olhava furiosamente para ela.
- Eu ia matar sua mestra primeiro, mas já que você insiste!
Ele correu para a garota quando foi impedido de uma forma estranha. Um trovão despedaçou a janela, entrou no quarto e atingiu o demônio lançando-o para fora do quarto. Bruna olhou para a mestra, mas não havia sido ela quem invocara o trovão.
Então uma figura surgiu na porta da sala. Um homem com uma longa barba caída sobre a armadura, mas não era uma armadura qualquer, uma armadura viking. Usava um tapa-olho sobre um dos olhos e um chapéu com chifres. Na mão estava uma espada curta e pendurado na cintura um pesado martelo. Seria impossível para um humano comum carregar todo aquele peso, mas o velho não parecia um humano comum.
- Mas o que diabos! - Asmodeus gritou e tentou se desviar do ataque do velho sobre ele.
Mas ele não conseguiu evitar, a espada curta desceu sobre o peito de Asmodeus cravando-se em seu coração. O demônio urrou de dor, mas estava preso ao chão pela espada. Então o viking tirou o martelo da cintura e com ele esmagou a cabeça do demônio, fazendo com que os pedaços se espalhassem pela sala, sujando até mesmo sua armadura de vermelho.
Uma nuvem negra surgiu no teto da sala e logo se dissipou, Asmodeus não iria mais incomodar, pelo menos não por um bom tempo.
- Vocês estão bem? - O velho perguntou, parecia preocupado.
Sarah se levantou e caminhou em direção ao homem e o abraçou.
- Obrigada, tio.
Ele retribuiu o abraço da mulher e então olhou para Bruna, ainda estava preocupado.
- E você criança?
- Estou... obrigada. Quem... quem é você?
- Meu nome é Odin.



















Continua......................................................................................

domingo, 29 de janeiro de 2012

Cap.8 - Iridescent

- Está pronto? - Urano perguntou, sua voz ecoando pela sala.
Daniel pôde perceber que todos voltaram sua atenção para Urano, aquele que parecia ser o mais velho dos elementais ali presentes. Ele olhava para Urano e as vezes percebia que o olhar dele era como o olhar de seu Pai. "Definitivamente foram criados por Ele." Daniel remoeu em seus pensamentos.
- Sim.
- Há muito tempo, logo após a espécie humana ter sido criada, uma legião de anjos foi enviada para a terra. Para proteger os humanos e proteger o próprio planeta do único que poderia causar o mal, que era o próprio mal: Lúcifer.
- Conheço essa tropa, eu estava nela. - Daniel interrompeu o gigante.
Então ele viu Urano sorrir, uma doce ironia passeava pelo rosto de Urano, ele esperava por aquela afirmação, ele desejava aquela afirmação e Daniel estava prestes a saber o porquê.
- Não, meu jovem, você não estava nela.
- Do que está falando?
- Antes mesmo de sua legião descer à terra uma anterior veio, uma missão que não se espalhou pelo céu, mas poucos escolhidos pelo próprio Deus desceram. Vieram ao planeta para proteger a obra do criador, a primeira legião comandada pelo quinto arcanjo. - Urano olhou fundo nos pensamentos do anjo, sabia que aquelas afirmações teriam o efeito desejado.
O quinto arcanjo era uma lenda entre os anjos. No início de todos os tempos, muito antes de governar absoluto sobre o universo, Deus criou 5 arcanjos: Miguel, Gabriel, Rafael, Uriel e Emanuel. A partir desses 5 surgiram todas as castas angélicas do céu, todas as ordens de anjos que tinha cada um dos arcanjos como seu patrono. Ao final dos 7 dias de criação, Deus enviou ao plano físico uma legião de anjos para proteger os humanos dos anjos caídos e demônios que porventura viessem atacá-los. Foi a última vez que essa legião foi vista, foi a última vez que Emanuel foi visto. Eles desapareceram e nunca mais soube-se nada deles, com o passar do tempo essa história foi considerada uma lenda no céu, o quinto arcanjo se tornou uma lenda bem como sua legião. Alguns anos terrestres depois, Gabriel recrutou 20 anjos para descer à terra e guiar os humanos no caminho divino, para seguir a vontade do Pai, entre eles estava Daniel.
- O quinto arcanjo é uma lenda, mesmo para nós anjos. Ele não existiu na verdade apesar de algumas provas substanciais, o próprio Deus nunca confirmou nada. - Daniel disse.
- Mas Ele não negou, negou? - Urano provocou.
O silêncio de Daniel confirmava a pergunta de Urano.
- O quinto arcanjo realmente existiu garoto. Emanuel desceu ao plano material com sua guarda. Mas fixaram-se longe do Éden. Quando chegaram e assumiram uma forma física puderam sentir algo que nenhum outro anjo havia experimentado até então, puderram sentir a mortalidade. A sede, a fome, o calor, o frio que para eles era totalmente controlável nos céus era, aqui na terra, forças além de seu controle. Estavam no meio de uma grande planície coberta de areia, sob o sol escaldante, lugar que mais tarde seria chamado de Saara. Caminharam em direção ao norte e no fim de 7 dias estavam exaustos, com sede, fome e submetidos às intempéries deste mundo. Foi quando Emanuel avistou alguns quilômetros à frente uma porção de água, o mar Vermelho. Correu em direção ao mar, deixando seus homens para trás, tentava utilizar suas últimas forças para chegar até a água e foi quando ele avistou a primeira elemental. Uma linda mulher saindo das águas, seu corpo estava nu, os cabelos morenos caíam ao longo das costas, os olhos verdes olharam para o arcanjo e naquele momento Emanuel sentiu o primeiro dos sentimentos humanos, sentiu algo queimando dentro dele, a paixão. A elemental veio de encontro a ele, seu nome era Gaia, a mãe da Terra, guardiã do planeta, criada pelo próprio Deus.
Os dias se passaram, anjos e elementais se cruzaram, se conheceram. Emanuel e Gaia se juntaram, se possuíram ou como diriam os humanos casaram-se. Em seus invólucros mortais, eles procriaram e Gaia teve filhos, assim como os outros anjos da tropa de Emanuel, eles encontraram pequenas populações humanas, distantes do Éden, lá eles conheceram as mulheres e lá procriaram.
A mesma coisa aconteceu com os elementais, eles conheceram humanos e anjos e procriaram com ambos. Dessas relações surgiram as duas maiores civilizações terrestres: Node, que mais tarde daria origem aos impérios no Oriente Médio e Atlântida, a princesa das nações.
Essas civilizações cresceram, os filhos dos gigantes e os filhos dos anjos eram superiores aos humanos, dotados de grande poder, força e inteligência e foram assim considerados deuses por eles.
Foi assim que surgiu as antigas lendas sobre Rá, Thor, Hércules, Set, Osíris, Amaterasu, Susanoo... Filhos de imortais e mortais, esses seres superiores governaram essas nações. Então sobreveio a queda do homem, sua desobediência e expulsão do Éden, foi assim que começou o primeiro cataclisma da história.
Atlântida e Node se uniram para construir uma torre, uma magnificação de suas civilizações, uma demonstração de poder da raça humana, dos elementais e dos anjos de Emanuel. Essa foi a torre de Babel. Foi então que Deus percebeu que essas civilizações não deveriam permanecer unidas, porque muito em breve a raça superior dominaria os humanos, os escravizaria e extinguiria a espécie do planeta.
Deus enviou um forte vento, um tornado que destruiu casas, tirou vidas e espalhou homens, anjos e elementais. Ele delimitou áreas das quais os elementais não poderiam cruzar, delegou os seres da água à agua, sem nunca poder dela sair, os do fogo ao fogo e assim por diante.
Atlântida foi movida para os oceanos e Node se instalou no coração da Ásia, aqueles chamados de deuses foram espalhados pelos continentes com seus governados, povoaram eles, mas foram castigados. Deus tornou os filhos dos elementais com os anjos e deles com os humanos estéreis, extinguindo assim a raça superior. As nações se revoltaram, passaram a adorar seus deuses, seus senhores mortais expulsando a presença de Deus do seu meio. Aproveitando-se dessa vulnerabilidade Lúcifer enviou suas hostes para o plano físico e invadiu a grande Node, destruindo a cidade e matando seus habitantes. Os sobreviventes se aliaram às colônias de Adão e seus filhos e voltaram-se para Deus.
Formou-se o primeiro conselho de contra ataque. Elementais, Emanuel e seus anjos e Deus reuniram-se nesta mesma sala onde estamos agora e organizaram legiões de ataque à Lúcifer. Ele foi vencido e expulso de volta ao inferno, uma batalha que durou séculos, vidas foram perdidas, inclusive a do quinto arcanjo, Emanuel morreu em batalha trespassado por uma lança atirada por Lúcifer.
Com o final da guerra, houve uma nova reunião do conselho. Gaia retirou-se e nunca mais foi vista, sumiu. Alguns dizem que ela dissipou sua essência na esperança de reencontrar, nos planos além deste, Emanuel. Os anjos tiveram sua graça retirada e tornaram-se mortais conforme seu desejo e assim passaram a viver como homens e nós, os elementais fomos proibidos de ter contato com anjos novamente. O primeiro contato nos levou à desgraça e isso jamais deveria ocorrer novamente.
Anos se passaram e uma nova legião foi enviada à terra, a sua legião. Foi nesse momento que Oceanus, temendo o que poderia ocorrer enviou Atlântida para o fundo do oceano, onde ela permanece até os dias de hoje.
- Isso... - Daniel tentou se manifestar, mas nenhuma palavra saiu de sua boca.
- Essa é a história de sua família rapaz, agora entende nossos receios com os anjos, vocês trouxeram a morte e a desgraça quando desceram à terra, isso jamais deveria ocorrer de novo, mas Oceanus confia em você, portanto nós também confiaremos. O destino de toda a espécie humana será colocado em suas mãos, se cumprir essa missão ou não, já estará além de nossos poderes.
Daniel acenou com a cabeça.
- Muito bem então - disse Minerva - preste atenção ao que irei lhe falar sobre o que você deverá fazer.














Continua....................................................................................

sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Cap.7 - From the Inside

- Levante-se, anjo. - Volcano disse, sua voz ecoavam por toda a cúpula. - Precisamos lhe mostrar algo.
Daniel tentou se levantar, ainda sentia a fraqueza dos músculos da perna, parecia estar deitado há séculos, sentiu um formigamento nas pernas e dores pelo resto do corpo. Ele ainda não tinha certeza de como não havia morrido, a lâmina de Uriel tinha poder para destruir qualquer ser no universo, separar sua aura, ou seu espírito de sua carne.
Mas Daniel era um anjo, um guerreiro, nos áureos tempos foi líder de tropas, não iria se deixar vencer por suas dores. Para ele já bastava a humilhação de não ter suas asas, de nunca mais poder tê-las.
Ele se colocou de pé e então Oceanus lhe entregou um par de muletas, que inicialmente o anjo recusou.
- Aceite, não são para humilhá-lo, são para ajudar. Vocês anjos desenvolveram muitas emoções ao longo dos milênios, mas a pior delas definitivamente foi o orgulho. - Disse o elemental da água.
Ele pegou as muletas mesmo contrariado, era duro de ouvir isso de um ser que há poucos instantes ele nem sabia que existia, mas que parecia conhecer tão bem os seres celestiais.
Os três caminharam vagarosamente até uma das grandes aberturas da cripta. A abertura dava para dentro de um salão, muito parecido com os edifícios gregos, pela janela um pouco distante, Daniel pôde ver toda uma cidade que se estendia bem ao fundo do oceano, uma civilização inteira, composta por humanóides e outros tipos de seres dos quais ele só ouviu falar em lendas humanas, mas que ele jamais considerou como sendo verdadeira.
- Essa é a minha cidade, a cidade que construí ao longo dos milênios mas que fui obrigado a esconder para proteger meus irmãos, meus cidadãos e minha família. - Oceanus disse - Essa é Atlântida.
A lendária cidade perdida, Atlântida, a princesa das civilizações e provavelmente a mais avançada que o mundo já viu. Daniel pôde sentir a aura mística que envolvia o lugar, fazia sentido apesar de inacreditável, memórias vieram à sua mente, mas ele fez questão de esquecê-las. Há milhares de anos foi designado para vir à Terra e vistar a tão bela cidade, mas pouco antes de sua chegada a cidade foi misteriosamente engolida pelo mar. Lá estava ela, agora, diante de seus olhos, toda a sua beleza se espalhando ao longo do fundo do oceano.
Edifícios magistrais, prédios maiores que o que ele já vira na superfície, uma grande cúpula mágica parecia envolver a cidade. Nas ruas seres fantásticos se cruzavam sem dar importância, acostumados ao longo dos milênios com seus compatriotas. Na praça central em frente ao palácio onde estava um grande obelisco se erguia, um mármore negro que ele jamais havia visto, mas que emanava poder e ele podia sentir.
- É fantástica. - O anjo admitiu.
- Isso meu caro é porque ainda não visitou a cidadela do fogo. - Volcano falava orgulhoso.
Então um dos humanóides com a pele coberta de escamas apareceu e falou algo ao ouvido de Oceanus. Oceanus parou por um momento e sorriu, virou-se para Volcano e acenou a cabeça.
- A hora é chegada. O conselho está reunido. - Oceanus anunciou
- Como reunido? De que conselho você está falando? - Daniel perguntou.
- O conselho dos elementais, os regentes do planeta. Venha é hora de conhecer meus irmãos. - Oceanus virou as costas e foi caminhando em direção a uma porta enorme, ela se abriu ao seu toque e uma grande sala surgiu. Não havia um teto sobre ela, apenas a cúpula que envolvia a cidade. No centro da sala uma mesa enorme de mármore negro em formato redondo. Ao redor da mesa seres fantásticos, os regentes do planeta, os poderosos elementais, gigante poderosos e Daniel podia sentir isso. Se juntassem suas forças seus poderes superariam e muito os poderes do arcanjo Miguel.
Daniel foi introduzido na sala, os gigantes olhando para ele, pela primeira vez sentiu um frio percorrer sua espinha, um sentimento tão humano, ignorado pelos anjos. Mas Daniel já não tinha mais certeza se era ou não um anjo, não mais.
- Este é o celestial do qual você nos falou Oceanus? - Um dos gigantes falou. Ele tinha uma aparência européia, uma longa barba branca que caía sobre uma armadura de guerra vinking que ele trajava. Um de seus olhos era coberto por um tapa olho e em sua cabeça repousava um um chapéu vinking de guerra. Se parecia muito com as antigas lendas nórdicas sobre seus deuses.
- Sim, Odin. - Oceanus falou.
- Ele parece assustado. - Uma voz feminina falou. A voz era doce, mas profunda, como se houvesse sabedoria em cada palavra, mesmo as mais simples. A mulher usava uma armadura de guerra, tinha os olhos cinzentos e um cabelo loiro que caía ao longo de suas costas enquanto seu elmo repousava sobre o mármore negro.
- Ele nunca ouviu falar de nós Minerva, como espera que ele reaja? - Volcano falou.
Oceanus e Volcano se sentaram e apontaram uma cadeira para Daniel. Ele podia sentir os olhos dos gigantes cravados sobre si, alguns tinham curiosidade mas a maioria parecia apenas desconfiada dele.
- Acha realmente que deveríamos entregar essa tarefa a um "anjo"? Você sabe muito bem o que eles fizeram ao longo da história, Oceanus, você sabe como foi obrigado a proteger Atlântida desses seres. Lembra-se de como o Pai deixava eles fazerem o que quisessem, como se o oitavo dia nunca houvesse terminado.
- Oitavo dia? - Daniel abriu a boca para perguntar, jamais ouvira falar daquele dia, mas no mesmo momento em que abriu sua boca percebeu que não deveria interromper o conselho.
- Oitavo dia é o dia da nossa criação. - Volcano falou - Quando Deus descansou no sétimo dia, reuniu suas forças e nos criou, esse talvez tenha sido um erro. Nós fomos criados a partir da própria essência dele sendo manifestada sobre a terra, é como se ele tivesse dado a nós seu poder. Mas com isso ele ficou fraco durante milênios, sua criação sugou suas energias. Ele se isolou, mas permaneceu no céu para reger o universo sem deixar que os anjos o percebessem. Depois de Lúcifer, outra rebelião levaria o céu e a terra ao caos, como está prestes a acontecer.
- Acho que devemos confiar nele. E além do mais esse garoto já não é um anjo. - Oceanus disse.
- O que quer dizer com isso? - Um outro gigante perguntou - ele vestia um manto negro como a noite, mas bordado com estrelas, como se eles vestisse o próprio céu.
- Urano, esse anjo foi quase morto pela espada de Uriel, o arcanjo da noite.
- Ele deveria estar morto. A espada de Uriel foi criada para destruir qualquer ser no universo. A única espada forjada para combatê-la é a de mármore negro. Mas nós sabemos que todo o mármore negro existente está aqui embaixo e a única espada forjada dele está nas mãos de Miguel. - Urano disse.
- Por que ele não está morto, Oceanus? - Minerva perguntou
- Quando hipocampo o trouxe para mim ele estava morrendo, seu espiríto estava preso por um fio invisível ao seu corpo, sua graça já havia sido dissipada, era um humano sem alma.
- O que você fez? - Odin falou sério para o irmão.
- Eu dei a ele um pouco da minha própria essência. - Oceanus falou com calma.
Odin bateu na mesa com a mão fechada, claramente estava irritado, uma tempestade pareceu surgir em seus olhos e trovões ecoaram ao longe.
- Você estava louco? Sabe o que isso significa? Você burlou a nossa regra principal, você entregou seu poder a um anjo. Não podemos confiar nele, assim como somos sua família, os celestiais são a dele! Se ele nos trair tudo estará perdido! - Ele trovejava as palavras.
- Calma irmãos. - Minerva interrompeu. - Ela ficou calada por uns instantes, olhava para todos dentro dos olhos. - Oceanus, você colocou nossas vidas, a vida de nossa família e de nossas cidades nas mãos desse renegado. Você tem certeza de que poderemos confiar nele?
- Sim, eu tneho. Há muitos anos venho observado esse anjo, ele foi renegado por sua família, caminha sozinho pela terra, veio com os primeiros anjos para guiar os humanos. Mas foi forçado a fazer coisas das quais se arrepende, tirou a vida de humanos que ele jurou proteger e até hoje isso o atormenta.
Daniel olhou espantado para Oceanus, como ele poderia saber tanto se nunca nem tinham se encontrado? Era como se sua vida fosse um livro aberto para o elemental. Ele se sentia fraco, impotente diante de tudo o que acontecia a sua volta, alvo de discussões, estava cansado de permanecer passivo diante de tudo à sua volta. Ele se forçou a levantar, sem a ajuda das muletas, forçou a ficar de pé sobre suas pernas fracas e ignorou toda a dor que cruzava seu corpo. Olhou para cada um dos gigantes na mesa que encerraram a discussão para olhar para ele.
- Eu não sou um humano, não sou um elemental, não sou nem mesmo um anjo. Talvez eu seja nenhum deles, talvez eu seja os três. Por anos me condenei quando falhei com minha verdadeira família: os humanos. Fui rejeitado por meus irmãos e passei a maior parte da minha existência caminhando sobre este planeta. Não me importa se confiam em mim ou não, também não gosto de algumas caras aqui, mas cansei de ouvir tudo calado. A espécie humana está abandonada à própria sorte, enquanto a guerra é travada no céu, Lúcifer está caminhando para a terra. Coisa que em breve o próprio Miguel pode fazer. Será o fim a menos que vocês impessam isso, porque se não o fizerem, eu farei isso sozinho.
Todos os elementais olharam para ele, um silêncio que parecia durar séculos até que foi quebrado pelo próprio Odin.
- É o suficiente pra mim. - Ele disse
Urano sorriu e indicou a Daniel novamente o lugar, ele via estampado na face do anjo a dor que permanecer de pé lhe causava. Daniel se sentou e por pouco a dor não o fez desmaiar.
- Como devemos chamá-lo, guerreiro? - Urano perguntou
- Daniel.
- Bem Daniel, sente-se, existe uma parte da história de sua própria família que você não conhece.















Continua................................................................

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Cap.6 - Between Angels and Insects

Tudo o que Daniel pôde ouvir foi um baque surdo na água, sua mente estava longe dali, seu corpo ia direto para o fundo da baía, sem resistência, sem luta. Estava acabado. Sua vida ia passando diante dos seus olhos, desde o início dos tempos, a grande explosão, a criação do universo, as lutas contra os humanos, as lutas ao seu lado, os amigos que perdeu, as paixões que sentiu. Quanto mais ele lembrava mais ele percebia que não morreria como um anjo, morreria como um homem, um mortal, suas experiências afastaram seus irmãos anjos dele, mas deu a ele a oportunidade de morrer com outros 6 bilhões de irmãos e irmãs. Morreria sem a graça de um anjo e sangrando como um mortal.
Então algo parou sua queda, seu corpo fora amortecido por algo e esse algo se movia, se movia com rapidez e fluidez pelas águas do oceano em direção ao oceano. Tudo ficou escuro e sua mente se apagou.
Quando acordou novamente enxergou uma espécie de teto, sentia-se vivo ainda, apesar dos ferimentos e cortes que lhe causavam dor estava vivo. Uma criatura apareceu diante dele, ela flutuava no ar, metade humana, metade peixe. Ao redor dela outros seres com a mesma humanóide, mas com misturas de peixe, alguns possuíam pernas e cabeças de peixe, outros pareciam humanos com barbatanas. Seres que em mais de 1 bilhão de anos ele jamais havia visto ou sabia que existia.
Então surgiu um ser diferente no meio deles, mais imponente, mais ancestral. Parecia um homem por volta de seus 50 anos, possuía barbatanas e guelrras brotavam em seu rosto. Sua pele era verde como a água do mar e ele possuía escamas espalhadas pelo corpo. Foi somente então que Daniel percebeu que era ele quem estava preso, estava dentro de uma espécie de incubadora com oxigênio enquanto todos os outros seres nadavam pelas águas.
O ser à sua frente disse algumas palavras que ele não pôde ouvir ou compreender e logo os demais saíram da sala. Um grande ruído surgiu no fundo e parecia que agora toda a sala estava envolta por uma esfera de ar, uma grande incubadora. O ser então retirou o vidro que o cobria e o suprimento de oxigênio de Daniel e começou a falar novamente, dessa vez em uma língua que Daniel compreendia, mas uma língua muito antiga, da aurora dos tempos.
- Sente-se melhor anjo? - O ser dizia.
- Quem... quem é você? - Daniel balbuciava e tentava se colocar de pé, sentia-se exausto, moído, uma dor lhe rasgava o espírito.
- O problema de vocês anjos é que nunca souberam agradecer, é assim desde de que Deus os criou e provavelmente permanecerão assim até o fim dos tempos.
- Como pode saber tanto sobre anjos, aliás como você pode existir, eu ando pelo universo desde a criação dele e nunca nem ouvi falar de seres como você.
- Concerteza já ouviu falar sobre mim anjo. - O ser sorriu - Já tive muitos nomes ao longo de minha existência, os mais ancestrais me chamavam de Oceanus, depois passaram a me chamar de Poseidon, Netuno... Pode me chamar pelo meu nome mais antigo, aquele que os primeiros mortais me diziam: Oceanus.
- Está me dizendo que você é uma lenda? - Daniel parecia incrédulo, mesmo para um anjo, aquilo era impossível,já teria ouvido falar daquele ser.
Oceanus se sentou em uma cadeira perto da incubadora e olhou bem fundo dentro de Daniel. Tinha olhos azuis da cor do mar e se olhasse fixamente para eles poderia jurar que via o movimento das ondas e das marés. Oceanus era um ser ancestral, não tão antigo quanto Daniel, mas parecia exibir uma sabedoria profunda, muito anterior à aurora dos tempos.
- Me deixe te contar uma história garoto. - Ele começou. - Lembra-se de quando o Pai criou este planeta?
- Lembro, eu fui designado para vir e confraternizar com as primeiras comunidades humanas há mais de cem mil anos atrás, vivi no meio deles, ensinei o caminho que o Pai havia escolhido para eles... Mas como pode ver não fui muito bem sucedido nessa tarefa.
- Existe uma parte da história que você não sabe, meu jovem. Deus saberia que chegaria o momento em que anjos e homens lutariam em lados opostos e do mesmo lado. Ele sabia que uma hora ou outra a terra chegaria a um desequilíbrio que alcançaria seu auge na batalha final. Mas ele não podia mudar o curso dessa história, ou melhor ele teria o poder necessário, mas ele jurou não interferir na vida dos homens, determinando seus destinos. Cada alma do planeta possui o livre arbítrio, a escolha de seu próprio caminho, Deus jamais forçaria isso às suas criaturas. Foi por isso que ele fez a forma do jeito que fez.
- Redonda? - O anjo não conseguia deixar o sarcasmo de lado e até Oceanus não pôde segurar a risada, era como o som do mar quebrando em ondas na praia.
- Não, ele fez da Terra uma forma de vida, assim como tudo que nela há. A terra, o ar, o fogo, a água, o metal, os trovões... tudo possui um espírito, todos são seres viventes.
- Isso é impossível, já teria ouvido falar de vocês, Deus não esconderia a existência de seres como vocês de seus anjos.
- É aí que se engana meu rapaz. Deus sabia que a ganância e orgulho corromperiam os anjos, sabia que eles se rebelariam e voltariam-se contra a humanidade. Por isso Ele nos deixou aqui escondidos de vocês, para governarmos a Terra guiando os humanos e limitando seus avanços e para proteger os homens de investidas angélicas que levassem ao fim da espécie Homo sapiens. Durante milênios estamos regulando os humanos e escondendo nossas atividades e nossas existências de vocês, não podemos impedir todas as catástrofes, mas podemos limitar seus danos e é isso que temos feito há anos.
- Pelo visto você não gosta muito de anjos.
- Lúcifer comanda o inferno e tem hostes prontas para vir a terra e depois ascender aos céus. Enquanto isso uma guerra civil se inicia para devastar o céu. Os homens estão abandonados à própria sorte e rumando para a destruição. Minha função e a dos elementais é impedir isso, preservar a obra de Deus até mesmo dela mesmo.
- Perde seu tempo Oceanus, os humanos destroem a si mesmos. Tudo o que anjos e demônios farão apenas acelerará o processo que os próprios humanos começaram, não há salvação. O próprio Deus se retirou do trono abandonando todo o universo à própria sorte. Sua luta é inútil. - A mágoa falava cada vez mais alto dentro de Daniel.
- Você perdeu a sua fé guerreiro? Perdeu a fé na espécie pela qual lutou e pela qual morreu? Acha mesmo um caminho sem volta? Deus pode ter deixado seu trono, mas não significa que abandonou todos os seus filhos.
- O que quer dizer Oceanus?
- O que ele quer dizer é que nós não perdemos a fé neste planeta, não perdemos a fé nos humanos, não perdemos nem mesmo a fé de que anjos como você podem mudar o destino de todos, evitando aquilo que ainda está por vir! - Uma voz ecoou do outro lado da câmara, uma voz forte que fazia todo o lugar tremer, então com ele veio o calor que fez até mesmo Daniel suar.
Daniel se virou e viu um senhor da mesma idade de Oceanus, mas mais barrigudo, mais forte, com o corpo vermelho e os cabelos em chamas, ele caminhava devagar mas fazia seus passos ecoarem no lugar.
- Esse é meu irmão, você pode chamá-lo de Volcano. - Oceanus disse
- Senhor das chamas, o espírito regente do fogo, a construção e a destruição de tudo aquilo que existe. - Volcano sorriu e então se virou para Oceanus. - Foi por isso que me chamou irmão? Para dar broncas em anjos renegados? Por favor não será com ele que poderemos virar o jogo! Não podia ser dele que o Pai estava falando.
Daniel olhou para os dois seres que ele jamais pensou existir, mas a última frase de Volcano fez Daniel tentar se levantar. "O Pai"? Eles haviam visto Deus depois que Ele deixou seu trono?
- Vocês viram a Deus?
- Claro garoto, todos já viram a Deus. - Volcano disse.
- Estou falando depois que Ele deixou os céus!
- Tudo obedece a um plano, Deus pode não interferir no curso das coisas, mas certamente não iria deixar elas caminharem para o fim sem ao menos tentar reverter a destruição iminente, Ele pode não quebrar suas próprias leis, mas até mesmo Ele pode achar um jeito de burlar e salvar a todos. - Oceanus disse e então olhou novamente Daniel bem dentro de seus olhos. - E você meu rapaz foi o escolhido para essa missão e agora que te vejo entendo o porquê.
- Por que? - Daniel e Volcano falaram juntos.
- Porque eu vejo em você o amor pela criação. Vejo a esperança dentro de seus olhos, vejo a mesma força que iniciou o Big Bang, vejo a determinação para parar até mesmo Lúcifer. - Oceanus sorriu e se levantou da cadeira. - Agora levante-se ainda temos muito o que falar.


















Continua..................................................................

terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Cap.5 - Never There

Rio de Janeiro, Cristo Redentor - 12 anos atrás

Do alto da estátua podia se ver uma silhueta. Um rapaz beirando seus 20 anos, vestindo uma camisa branca e uma calça jeans. De suas costas saíam um par de asas e na cintura ele carregava pendurada uma espada, muito parecida com as espadas gregas. Ele olhava fixamente no horizonte, os pensamentos perdidos muito longe dali. Na sua mente ele via os anos passando, as eras, desde o início dos tempos. Queria poder esquecer, queria não ser forçado a lembrar de cada momento, de cada luta, mas ele era um imortal, jamais se livraria desse fardo a não ser que seu corpo fosse destruído e sua existência voltasse à unidade do cosmo.
- Sabia que ficar remoendo suas dores não vai ajudar a curá-las? - Uma voz surgiu atrás dele, uma voz conhecida que há muito tempo não era ouvida.
Atrás dele um rapaz de cabelos loiros ondulados, olhos castanhos profundos e uma barba falhada espalhando-se pelo rosto. Parecia ter seus 30 anos e parecia estar vestido para uma guerra. Usava uma armadura completa de batalha, mas estava sem o elmo que ele segurava em uma das mãos. Da cintura, pendia uma espada negra como a noite, forjada na explosão do universo, uma arma indestrutível.
- É necessário pra eu não esquecer nenhuma delas, nem a mais idiota delas.
- Acho que viver entre os humanos por tanto tempo está te tornando um fraco. Já faz quanto tempo que não sai da Terra? Duzentos anos talvez?
O rapaz se virou para encarar o jovem loiro, havia ressentimento em seus olhos, havia muito mais do que isso, lá no fundo, um ódio era alimentado há décadas.
- O que você quer Uriel? Não teria algo melhor pra fazer como puxar o saco do seu irmão por exemplo? - O rapaz assumiu um tom irônico.
Uriel se aproximou, uma pequena chama surgiu em seus olhos e por um breve momento ele levou a mão à espada. Mas logo em seguida relaxou.
- Tinha me esquecido de que você nutria um sentimento protetor por esses pequenos bonecos de barro criados por Deus.
- São tão criaturas dele quanto eu ou você, Uriel. Sabe que se o Pai ouvir seus pensamentos você terá sérios problemas, ou você se esquece que Lúcifer começou assim também?
- Nunca me compare com um merda como aquele querubinzinho. Ele traiu a confiança do Pai, queria destruí-lo e tomar para si o lugar dele. Eu estou mais como um protetor das obras da criação. - Ele apontou para o horizonte. - Há mais de dez mil anos que os humanos destroem e manipulam a natureza, destroem a si mesmos e a tudo em sua volta. Não merecem este planeta, não merecem permanecer existindo.
O anjo se virou para Uriel, havia algo de errado, algo de diferente. Muitos anjos não gostavam dos humanos mas jamais se expressariam de forma tão aberta. Porque se o Pai os ouvisse, eles seriam condenados, expulsos do céu, a ordem sempre fora amar os humanos e os últimos desobedientes ocupavam o inferno agora. Ainda mais sendo Uriel um arcanjo, um ser da mais alta patente celestial, se ele chegava a esse ponto era porque algo estava acontecendo no céu, algo nada agradável.
- O que está havendo Uriel?
- Você está sendo convocado para se juntar as legiões de Miguel, velho amigo.
- Legiões de Miguel? Desde de quando elas pertencem a Miguel? Achei que todas pertencessem a Deus.
Uriel sorriu, esperava por aquela pergunta pois tinha a resposta na ponta da língua.
- As coisas mudaram um pouco e uma nova era está para começar. Na virada do milênio Deus deixou seu trono, abandonou o céu e se retirou. Ninguém sabe onde Ele está ou se irá retornar o que significa que nós, os arcanjos somos os novos governantes do Universo, mas nem todos parecem estar muito contentes com isso.
- O que você está falando? Isso... Isso é impossível, é uma mentira.
- Quem dera meu amigo, quem dera. O Pai nos deixou, nos abandonou à nossa própria sorte e por conseguinte abandonou também sua criação. - Uriel fez uma pausa. - Miguel e eu estamos reunindo algumas legiões para lutar contra os novos rebeldes celestiais, sabe como é, com uma mudança no poder nem todos ficam muito felizes, e é por isso que eu vim convocá-lo para se juntar a mim e a Miguel contra esses insurgentes. Todos sabem que Miguel é o governante de direito.
- Quem são os insurgentes? - O anjo perguntou.
- Gabriel e Rafael estão unindo suas tropas para se levantar contra Miguel. Uma atitude rebelde por parte de meus irmãozinhos, uma atitude que será severamente punida.
- Gabriel e Rafael nunca foram afixionados pelo poder. Por que agora? - O anjo sabia que havia algo mais por trás dessa história, algo que Uriel não estava contando.
- Uma pequena divergência de opniões.
- Quanto ao que?
- Tratamentos a serem dispensados para os bonecos de barro. - Uriel era sempre evasivo, era um diplomata celestial, era da sua natureza ser evasivo, negociar, enganar. Só havia um ser no universo que poderia ser melhor que ele nesse quesito, e esse era Lúcifer.
- Deixe eu advinhar... - O anjo escolheu as palavras com cuidado. - Você e Miguel pretendem destruir a humanidade enquanto Gabriel e Rafael querem evitar que isso aconteça.
- É uma forma simplista de ver as coisas, mas é por aí mesmo. - Uriel sorriu de um jeito irônico e cruel.
- Não acha que é idiotice vir até mim pedir ajuda? Você sabe o que penso sobre os humanos. Pro bem ou pro mal eles que se destruam sozinhos, não vou interferir de modo algum nisso. O que te leva a crer que lutaria ao seu lado?
- Você é um excelente soldado Daniel, um dos melhores lutadores que já vi. Deixou que um pequeno impasse tirasse sua força e sua coragem para lutar. Um erro que pode ser redimido, seria uma pena tê-lo como inimigo. Eu vim até aqui te oferecer poder, um poder que você jamais experimentou.
- Obrigado mas eu serei forçado a recusar, Uriel.
Uriel colocou a mão na bainha e puxou a espada. A lâmina negra exalava medo, angústia, era uma arma diferente de toda e qualquer outra existente. A lâmina que expulsou anjos caídos para o inferno, a lâmina que enfrentou Lúcifer. Um presente dado por Deus ao arcanjo guerreiro, líder dos querubins, uma arma indestrutível, assim como seu possuidor.
- Sabe porque essa espada é tão temida? - Uriel perguntou
- Não faço idéia. - Daniel levou a mão ao cinto para sacar sua espada, estava pronto para o combate se fosse necessári, mesmo contra um arcanjo, mesmo com a morte certa, não morreria sem lutar.
- Essa espada não costuma matar rapidamente. Um único corte dela e seu espírito se desprende de seu corpo, um único corte dela e anjos se tornam um corpo inerte, humanos se tornam bonecos, demonios e deuses... Todos destruídos por um único corte. Penso a você que reconsidere sua decisão Daniel.
- Minha decisão foi tomada.
Uriel colocou a espada em posição de ataque e partiu para cima de Daniel. Suas asas se abriram em pleno vôo, fazendo com que ele quase aterrizasse sobre o anjo. As duas figuras angélicas lutavam sobre o braço do Cristo Redentor, um espaço estreito, onde não poderiam haver erros.
Daniel desviou do ataque e teve que se apoiar na cabeça da estátua para não cair.
- Você está sem prática anjo! Ou deveria chamá-lo de mortal?
Daniel partiu novamente para o ataque. O sangue borbulhava em suas veias como há muito tempo não acontecia, desde o dia que mudou sua história, há muito tempo não era forçado a lutar, mas ele conhecia sensação, o êxtase da batalha.
A espada desceu em um ataque sobre Uriel, mas o arcanjo bloqueou e empurrou Daniel para fora da estátua. Daniel perdeu o equilíbrio e foi em direção ao solo, não conseguia evitar a queda. Suas asas estavam sem a força de antigamente. Quando caiu sobre o chão de cimento sentiu alguns ossos se partirem e o sangue escorrer pelo cimento.
Procurou sua espada com o olhar, mas não podia encontrá-la. Uriel aterrizou som os joelhos em suas costas e Daniel pôde sentir sua espinha se partindo.
- Procurava por isso? - Uriel gritava
Com a espada do próprio anjo em uma das mãos e a lâmina grega em outra, Uriel cortou as asas do anjo, amputando-as e deixando apenas dois cotos em suas costas. Um grito de dor ecoou pelo Corcovado, era humilhante ter suas asas cortadas, era a maior humilhação para qualquer anjo. Uma dor excruciante, uma dor mortal. Daniel gritava pela dor enquanto mais sangue escorria de seu corpo e agora de suas costas.
Uriel lançou o anjo aos pés da escada e jogou a espada do anjo ferido em sua direção. Daniel agarrou a espada e tentou se colocar de pé mas era inútil, a dor cegava, em breve ele apagaria.
- Você poderia ter tido tudo Daniel. Poderia ter sido general de legiões mas escolheu uma morte humilhante. Que assim seja!
Uriel se aproximou e cravou a lâmina negra na lateral do corpo do anjo. Daniel então sentiu uma onda elétrica percorrer todo seu corpo, sentia o sangue fluindo por sua boca, sentia seu espírito sendo arrancado.
Uriel pegou o corpo quase inerte do anjo e o lançou o mais longe que pôde em direção à baía de Guanabara. Enquanto caía Daniel sentia a graça de Deus fluindo para fora do seu corpo, sentia as energias o abandonando e começou a ficar tudo tão escuro...
Tão escuro e logo ele já não via mais nada, já não sentia mais nada... Seus pensamentos ecoavam no vazio, ele abraçava a morte, como um mortal.













Continua....................................................................

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Cap.4 - Pretty Handsome Awkward

Bruna dirigia devagar pra casa, forçava o carro a andar em uma marcha reduzida, em uma velocidade reduzida. Não tinha pressa de chegar em casa, já não tinha mais pressa pra nada, seu mundo havia virado de cabeça pra baixo do dia para a noite e todos os seus sonhos e pesadelos pareciam se tornar reais. Alguns carros passavam por ela buzinando, outros apenas piscavam o farol, mas ela sabia que no fundo todos a xingavam pela baixa velocidade. Mas ainda assim não tinha pressa.

Um camaro ZL-1 preto parou na rua. Asmodeus desceu altivo como sempre, caminhou pelo jardim devagar em direção a entrada da casa. Uma voz ecoou das sombras formadas pelas árvores no muro, ela chamava seu nome, era uma velha conhecida, uma conhecida de milênios.
- Asmodeus, o que veio fazer aqui? - A voz sibilava.
- Vim terminar o que você deveria ter terminado noite passada, mas foi incompetente demais para fazer.
- E quem te deu o direito de falar assim comigo, seu pequeno pedaço de merda? - A voz ficou agressiva.
Asmodeus se virou, as mãos agarrando as sombras, era como se ele as puxasse para fora da parede, um pequeno vulto surgiu, o vulto de uma mulher. Ele arrancou com força o vulto da parede e a jogou no chão. O corpo tomou forma enquanto rolava pela grama, uma mulher vestindo um corpete negro e uma calça da mesma cor, os cabelos eram tão escuros quanto as sombras e caíam embaraçados pelo corpo.
Asmodeus se agachou ao lado da mulher, seus olhos assumiam um tom vermelho como o sangue o que fez a mulher tentar recuar um pouco, mas ele a puxou pelos cabelos.
- O que me dá o direito de falar assim com você? Deixe eu pensar... Talvez o fato de eu andar pelo universo há muito mais tempo que você, ou então o fato de eu ter sido um general querubim, ou talvez o fato de você ser apenas uma humana, uma mulher rejeitada que fez carreira no inferno deitando-se com todos os anjos caídos... - Asmodeus passou a mão no rosto dela devagar, quase com carinho - Lilith, nunca mais me desafio ou terei o prazer de torturar você por mil anos.
Ele se levantou calmamente caminhando em direção à porta da casa. Virou-se por um breve momento para falar algo, mas a mulher já havia sumido, voltando as sombras, bem longe dali, bem longe de Asmodeus. Ele bateu na porta, duas batidas rápidas até que uma mulher apareceu sorrindo por reconhecer a figura que surgia na sua frente.
- Asmodeus? O que faz aqui a essa hora? Já não deveria ter voltado? - A mulher perguntou.
- Fiquei com sono no caminho para casa, não estava muito longe daqui, tive medo de prosseguir na estrada com sono, sabe como é perigoso. Queria saber se não teria um café, ou uma água, enquanto eu descanso um pouco. - Ele sorriu
- Claro, entre por favor. Me acompanhe até a cozinha. - A mulher virou-se e foi na frente.
- Você é um anjo Martha, um anjo eu devo dizer.
Martha começou a fazer um sanduíche, enquanto Asmodeus sentava-se na sala. Então ele se levanta e avisa que está indo ao banheiro. No caminho ele pára e entra no quarto das filhas de Martha, mas quem vê ali dormindo não é quem ele queria. Natalie dormia enrolada nas cobertas, dormia como um anjo. Asmodeus sorriu.
- Garota de sorte essa Bruna, achei que já teria voltado da casa da amiga. Mas não vou perder a viagem, já que ela foge de mim, vou deixar um pequeno presentinho pra ela quando chegar. - Ele susurrava. - Que o jogo comece.

Bruna estava chegando em casa quando algo a fez gelar ao volante. Um clarão surgia de dentro do condomínio onde ela morava, então labaredas surgiram no céu. Ela pode ouvir ao longe o crepitar das chamas e o cheiro de queimado. Ela começou a tremer... Vinha da exata direção onde ficava sua casa. Ela passou as marchas e acelerou para entrar no condomínio.
Quase atropelou um guarda que estava em seu caminho. Um pensamento lhe passou pela cabeça, mas não poderia ser, não aquilo, aquilo era demais.
Quando chegou finalmente ao seu destino não pode acreditar, saiu do carro gritando em direção as chamas. Era sua casa, sua casa que estava pegando fogo. Ela ouviu gritos vindo de dentro do lugar, era a voz de sua mãe, gritava de horror. Bruna não pensou duas vezes e saiu correndo para dentro das chamas, não sentiu o chamuscar de seu cabelo nem o calor na pele, ela só queria ir de encontro à sua mãe.
Encontrou ela caída em um canto da cozinha, uma pequena poça de sangue se formava ao redor dela. Martha usava a blusa que Bruna havia comprado de natal para ela, mas agora o que sobrara fora um rasgo e uma grande mancha de sangue. Bruna correu até a mãe, ajoelhou-se e a abraçou, gritou diversas vezes seu nome, gritava para qualquer um que pudesse ouvi-la, mas seus gritos ecoavam surdos em meio as chamas.
- Mãe! Mãe! - Ela balançava o corpo inerte no sue colo, chorava, gritava, mas nennhuma reação.
- Você mereceria o oscar pela dramatização garota. - Uma voz surgia das chamas.
Então o que ela viu adentrar no recinto não era humano, não poderia ser. Um ser com parte do corpo queimado, um terno de giz rasgado pelo fogo e pelas asas demoníacas que surgiam de suas costas, metade de seu rosto era nada além de carne queimada e apodrecida, mas na outra metade ela pôde reconhecer...
- Asmodeus! O que....
- Vou poupar as explicações querida, elas são necessárias. Vim aqui para terminar o que Lilith foi incapaz, vim aqui para te matar de uma vez por todas. Você não se incomoda não é?
- Você! Você matou minha mãe! - Ela gritava, mas sem parar de soluçar.
- Estamos constatando o óbvio agora? Porque você ainda não encontrou o corpo carbonizado da sua irmã lá em cima ou o do seu pai pendurado no terrado do meu prédio não é?
A família de Bruna, tudo o que ela tinha, havia acabado, não havia restad mais nada. Aquele... demônio havia tirado tudo o que ela tinha e agora iria tirar sua vida também. Ela não tinha forças para lutar, ela não queria lutar, não havia pelo que lutar. Abaixou a cabeça esperando pelo golpe final enquanto abraçava forte sua mãe. Sua vida, seus momentos passando bem diante dos seus olhos, um pequeno filme, tão breve...
Asmodeus desceu as garras sobre a cabeça da garota, o golpe final. Ele já podia sentir o gosto da vitória. Mas algo o deteve, uma força, parecia haver um escudo sobre a garota, uma barreira invisível que ele não conseguia transpor, um velho truque de proteção, um truque que ela jamais poderia ter. Er um antigo truque angélico chamado de Cápsula Divina. Ele se reteve e deu dois passos para trás.
- Mas o que? - Bruna se deu conta de que ele não poderia atingi-la, uma raiva súbita a dominou.
Um ódio brotou dentro de si, uma fúria que ela jamais experimentara. Ela abriu a boca e começou a conjurar encantamentos muito antigos, célticos. As palavras brotaram de sua boca enquanto ela lembrava das horas de treinamento e dos livros de encantamento que ela lia de sua mestra, uma wicca.
Uma labareda pareceu tomar forma e foi lançada contra Asmodeus arremessando ele em direção às chamas. Mas aquilo não o deteria, não por muito tempo. Bruna tentou levantar a mãe e correr para fora da casa.
- Acha que umas palavrinhas mágicas podem me deter mortal? Eu sou Asmodeus, um dos 4 príncipes infernais! - Ele se lançou contra ela, as asas capengas abertas dando a ele uma aparencia ainda mais aterradora.
Ele ouviu novas conjurações, mas dessa vez não vinham da garota. Eram mais fortes, era de alguém com mais poder. Dessa vez Asmodeus recuou.
Uma mulher apareceu nas chamas, ela vestia uma camisola branca, coberta por um robe da mesma cor, tinha os cabelos ruivos e olhos pareciam estar em chamas. Ela tinha um corpo esguio, mas caminhava com firmeza pelo fogo.
- Outra bruxa. - Asmodeus sorriu
A wicca conjurou mais encantamentos e uma onda de fogo se formou atrás dela derramando-se sobre o anjo caído, lançando ele numa parede que logo desabou sobre ele. Ele havia sido parado, pelo menos por ora.
A wicca correu na direção da Bruna e a abraçou, tentou tirar ela do fogo, conjurando para que as chamas saíssem do seu caminho.
- Vai ficar tudo bem minha criança.
- Mestra... Minha mãe...
Elas saíram do fogo, Bruna ainda abraçava a mãe, não a soltaria por nada. A mestra continuou forçando Bruna a caminhar até um monza vermelho estacionado na porta da casa em chamas. Elas ouviram sirenes dos bombeiros ao fundo, logo eles estariam ali. Mas o que a mestra queria era tirar as duas dali antes disso acontecer. Perguntas demais a responder e aquele não era o momento. Ela podia sentir a alma de Martha se esvaindo e se ela não agisse rápido Martha estaria morta.
- Precisamos sair daqui rápido. Coloque sua mãe no carro e vamos para minha casa já.
- Mestra...
- Faça.
Enquanto Bruna colocava a mãe dentro do carro viu uma silhueta se formar no fogo. Asmodeus ainda estava ali, mas deixaria elas irem embora, ele gostava de jogos e esse acabava de começar.












Continua......................................

sábado, 21 de janeiro de 2012

Cap.3 - A Little Piece of Heaven

Quando chegaram em casa, Bruna e Natalie se depararam com uma estranha visita. Um homem por volta de seus 50 anos, vestindo um belo terno risca de giz, com cabelos negros meio esvoaçados e usando mocassins estava sentado na mesa do café conversando com a mãe das garotas.
- Olá crianças. - O homem sorriu gentilmente, mas havia algo de cruel em seu sorriso entretanto era muito bem disfarçado pela boa aparência e boa fala que ele apresentava.
- Meninas esse é Asmodeus, ele é sócio do seu pai no escritório de advocacia. Veio dizer que ele deverá ficar por lá mais uma semana, algo sobre um contrato com uma multinacional, mas ainda não entendi muito bem.
- Fique tranquila Martha, tem minha palvra de que trarei seu marido inteiro e salvo daqui a uma semana.
- Papai vai ficar mais tempo fora? Por que ele não ligou? - Bruna perguntou desconfiada do homem, aliás parecia ser a única no recinto que sentia uma estranha repulsa em relação a ele.
- Ele está meio que... pendurado com os prazos. - O homem sorriu - mas em breve ele estará de volta.
Bruna aceitou a resposta, mas ainda permanecia desconfiada, o que era estranho, parecia haver algo sombrio e medonho por trás daquele homem. Algo que lhe causava arrepios. Naquele momento, no entanto, tudo com o que se preocupava era conseguir ir visitar Joaquim, conforme o combinado, mas a pressa era tanta que ela iria ignorar a vontade de esperar ele por mais um dia, chegaria no lugar combinado naquela mesma noite.
- Mãe posso pegar o carro emprestado hoje a noite? - Bruna pediu.
- Pra que minha filha?
- Queria visitar uma amiga que tem casa ali em Rio das Ostras, não vou demorar muito, só uma visita, ela me disse que estava ali hoje pelo telefone. - Ela tentou se esquivar.
- Ora Martha, deixe a menina ir. Deve ser importante a visita, não acontecerá nada demais. - Asmodeus tentou falar em favor da garota.
- Tudo bem então, você vai a noite certo? Então venha, vamos almoçar.
As garotas se sentaram na mesa enquanto Martha colocava o almoço, a tarde correu sem problemas. Asmodeus foi embora logo após o almoço, levou embora o camaro estacionado na frente da casa, carro que até então Bruna não havia reparado que estava ali. Quando a noite caiu, Bruna pegou o carro e partiu em direção a casa mencionada pelo anjo. Demorou um pouco para encontrar mas finalmente lá estava. Um velho chalé de madeira, em frente à praia, sem carros estacionados, a casa parecia fechada há anos e ela diria que estava abandonada não fosse por uma fraca luz que saía pela janela da frente.
Ela bateu duas vezes na porta até que uma senhora apareceu, parecia ter uns 70 anos, vestia uma camisola, estava pronta para ir dormir apesar de ainda ser apenas 21:00.
- Posso ver o Joaquim?
- Você veio mais cedo do que eu esperava menina. - A velhinha disse, bondosa - Mas entre, ele está lá em cima sentado no quarto.
Ela subiu as escadas devagar até o segundo andar do chalé. Entrou no quarto e viu Joaquim sentado, reclinado numa cadeira, o olhar perdido, parecia meio pálido, estava fraco, nem parecia o rapaz que a salvou na noite anterior de um lobo gigante e uma mulher de sombras.
- Joaquim? Você parece tão... pálido. O que houve? - Bruna estava preocupada.
- Eu fiz uma troca lembra? Eu te dei a minha essência, somente através disso você pode permanecer viva. Mas você veio mais cedo do que eu pedi, deveria começar a prestar atenção nos dias e horários menina. - Ele a repreendeu, mas ela nem mesmo deu ouvidos.
- Isso quer dizer que... você vai morrer?
- Morrer é um termo muito mortal, eu vou voltar para a Unidade, de certa forma continuarei existindo dentro de você, mas minha matéria se dissipará. - Ele falava tranquilamente.
- Mas isso é um absurdo! Você não pode morrer, nós partilhamos a sua essência, deve ser o suficiente para os dois. É loucura você morrer por minha causa, pára com isso! Há 2 dias eu nem mesmo acreditava em anjos, nem mesmo em Deus, e no momento em que eles finalmente se comprovam reais eu devo sobreviver as custas de um? Eu não quero.
- Criança, você não tem escolha. Minha tarefa era protegê-la, mantê-la viva e foi o que eu fiz. Você conhecerá outros anjos muito em breve, aliás muitos seres além de anjos, uns nem tanto agradáveis.
- Se você deve me proteger como morrer vai ajudar nisso?
- Fiz o que devia ser feito garota e chega dessa dicussão, o que eu fiz é irreversível, agora preste atenção, sente-se porque eu já não tenho muito tempo.
Bruna se sentou, inconformada com aquilo. Pra ela era um absurdo, sempre seria, as lágrimas lhe brotaram nos olhos, nunca havia lidado com a morte tão de perto. E tudo em apenas dois dias, anjos, demônios, sua vida de ponta a cabeça em cerca de 24 horas. Joaquim percebeu os pensamentos e sentimentos que borbulhavam dentro dela, ele a compreendeu e tentou confortar ela, mas não seria suficiente.
- Escute Bruna, eu queria ter mais tempo para te explicar tudo mas eu não tenho. As coisas aconteceram mais rápido do que eu imaginei e eu deveria ter me antecipado, mas fui negligente. Pelo meu erro você deverá sofrer, mas eu espero minimizar isso o máximo possível.
- Do que você está falando?
- Há muito tempo, milhares de anos na verdade, houve uma rebelião no céu. Havia um querubim ungido, seu nome era Lúcifer. Lúcifer era um dos anjos amados por Deus, mas ele tinha ambições ainda maiores. Lúcifer queria conhecer tudo, queria ser tudo, ele ambicionava demais e tramou uma conspiração. Ele era forte e belo, um excelente orador e fez promessas de um novo paraíso, uma nova ordem celestial de igualdade entre o criador e suas criaturas. Mas no fundo ele queria apenas tomar para si o trono do Pai. Muitos anjos se juntaram à sua causa. Cerca de um terço de todo o exército celeste colocou-se ao lado dele. Começou uma guerra civil que durou mais de mil anos e no final dela Lúcifer e seus anjos foram expulsos do paraíso e lançados numa dimensão obscura onde as trevas reinavam, um lugar de dor e tormentos... o que vocês chamam de inferno.
- Conheço essa história.
- Não, ainda não a conhece totalmente. Logo após isso Deus criou a terra e todas as coisas além dela no universo, moldou cada planeta e cada ser vivente. A espécie humana nasceu e floresceu, reproduzindo-se e ocupando a terra. Mas então veio a queda do homem, humanos se desviaram do plano original, conheceram o pecado, deixaram os demônios entrarem no meio deles, anjos caídos e no final faziam as maldades por si só. Não podíamos interferir, Deus havia presenteado eles com o livre arbítrio, fazendo deles, senhores de suas consciencias, diferentemente de nós que de certa forma estamos ligados às nossas missões. Podemos ter sentimentos, e até mesmo nossos defeitos, mas estamos ligados ao céu. Por exemplo, eu sou um querubim, um anjo de combate. Há também os serafins, anjos adoradores, conhecedores do universo. Há os mensageiros, os estudiosos, os anjos da guarda... Estamos ligados às nossas funções.
- É complicado de entender, não faz muito sentido.
- Em breve fará, mas me deixa continuar. Então um dia, algo aconteceu. Deus deixou o seu trono, havia se retirado do paraíso e simplesmente desapareceu. Isso foi há mais ou menos 12 anos terrestres. E desde então um novo conflito se iniciou no céu, a luta pelo trono de Deus. De um lado Miguel e Uriel, o príncipe dos arcanjos e seu irmão mais novo. Do outro Gabriel e Rafael lutam pelo poder, lutam para salvar a sua espécie.
- Como é? - Bruna se assustou
- Miguel e Uriel são radicais, cansaram-se das maldades cometidas pelos homens e estão decididos a destruí-los, limpar do universo a raça humana e logo depois começar a limpar o próprio inferno, arrombar seus portões e destruir Lúcifer e seus demônios. Já Gabriel e Rafael, prezam pelo direito de vocês usarem seu livre arbítrio, lutam para esperar a volta do Pai e o início do apocalipse. E enquanto essa batalha é travada nos céus, a Terra fica abandonada aos agentes do inferno, tornando-se domínio das trevas enquanto Lúcifer prepara uma nova investida, dessa vez para trazer o paraíso abaixo.
- Você está do lado de quem?
- Parece óbvio não é? Estou do lado de Gabriel e Rafael, mas não tem sido fácil, poucos anjos ainda estão na terra guiando os humanos, protegendo eles, enquanto a maioria de nós escolhe um lado e luta.
- Qual o meu papel nisso tudo? Por que sou tão importante, como uma simples mortal pode interferir em uma batalha de gigantes?
- Você é uma peça fundamental, mas nem mesmo eu sei seu papel. Sei apenas que deveria te proteger e falhei nessa missão.
- Você me salvou!
- Não a tempo. Não a tempo suficiente.
Joaquim começou a tossir fortemente e uma mancha de sangue surgiu no lenço que ele usava para limpar sua boca. Ele sabia que seu tempo estava acabando.
- Droga! Eu não vou nem mesmo finalizar o que tenho para te dizer.
- O que está falando? Você vai morrer agora? - Bruna começou a tremer e novamente as lágrimas brotaram em seu rosto, fizeram seu coração borbulhar...
- Bruna, você deve partir, voltar para junto da sua mãe e de sua irmã e protegê-las. Vocês não devem mais ficar aqui, voltem para o Rio de Janeiro. Vá até Botafogo, e procure por um anjo.
- O que? Isso é loucura, como espera que eu convença minha mãe a voltar para o Rio de Janeiro e como espera que eu ache um anjo em Botafogo? É doidera!
- Você saberá que é ele quando enconrá-lo, ele está.... na rua Voluntários da Pátria... perto de um...
Ele começou a tossir novamente, a hora havia chegado e Bruna deveria partir.
- Vá embora agora! - Ele gritou
- Fique calmo, não preciso sair daqui!
- Você não entende? Fui criado pela vontade de Deus, sou um espírito composto pela graça de Deus e energia. Eu lhe dei minha energia, mas a graça continua, é o que faz de mim um anjo e não um mortal e neste exato momento ela está se dissipando. Mas eu não posso conter, eu não posso controlar, eu não sei o que pode acontecer. Saia já daqui!
- Eu não quero! Eu não posso te deixar agora.
- Vá, você ainda tem muita coisa a fazer! - Seu corpo começou a brilhar, uma aura envolveu o lugar e de repente começou a ficar muito quente. Um peso invisível parecia cobrir o ambiente deixando Bruna com dificuldades para respirar.
- Vá... por favor...
Bruna tentou se arrastar para fora do quarto, com muita dificuldade desceu as escadas. Mas a aura parecia inundar toda a casa. A senhora idosa já não estava lá e Bruna não parou para se perguntar onde ela tinha ido. Saiu correndo da casa, girou a chave do fiesta que estava dirigindo e acelerou, para o mais longe possível daquele lugar. Quando já estava quase chegando na estrada viu uma explosão de luz que chegou até os céus, era como se um trovão se formasse debaixo para cima. Ela sentiu uma pressão no peito... Joaquim havia ido embora.
Já não havia mais jeito, não havia mais volta, tudo o que ela conhecia, tudo naquilo que acreditava estava prestes a mudar.
Era um caminho sem volta, um ponto sem retorno.














Continua..........................................................

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Cap.2 - Real World

- Bruna! Está na hora de acordar minha filha... já são quase meio dia, o sol está lá fora e você aqui dentro. Chame sua irmã e vá para a praia.
Bruna levantou devagar da cama, a cabeça doía, parecia que havia apanhado a noite inteira. Tivera um sonho estranho, sonhou que corria pelas ruas debaixo de uma bruma, com um lobo demoníaco atrás dela e logo depois uma mulher surgiu das sombras e cravou as unhas em seu peito, tentava arrancar algo dali. Mas parecia tão real, ela podia sentir as unhas da mulher perfurando sua carne, podia sentir sua vida se esvaindo até que... Um homem, apareceu e depois... já não se lembrava de mais nada.
Ela levantou devagar da cama, caminhou para o banheiro, trancou-se lá dentro e preparou-se para o banho. Um hábito estranho esse de tomar banho antes de ir à praia, mas ela encarava omo uma purificação da noite, uma purificação dos pensamentos, era apenas mais um ritual como os tantos outros que realizava. Bruna é uma wicca, uma adoradora da natureza e da mágica que nela existe. Acreditava que o planeta era uma forma de vida, como ela própria era, acreditava que cada componente do planeta, as forças elementais também eram vivas e estava aprendendo a lidar com elas aos poucos, de certa forma era mais uma iniciante do que uma wicca propriamente dita.
Olhou-se no espelho e recitou sua saudação matinal, um ritual tão antigo quanto os contos celtas, mas essencial para iniciar um dia, uma reunião, uma vida. Então reparou em seus cotovelos, estavam ralados, exatamente como no seu sonho. Ela se assustou e então tirou sua blusa para verificar se as marcas das unhas também estavam presentes e lá estava... 5 pequeninas marcas de unhas. Ela as tocou, não pareciam reais, nada daquilo parecia ser real.
Alguns momentos depois sentou-se à mesa do café, pegou um pedaço de pão enquanto sua mãe comentava:
- Cuidado ao andar por aí Bruna, ouvi os vizinhos comentando que ouviram uivos bem altos ontem a noite, parece que algum dos condôminos deixou um cão à solta. E como se não bastasse isso, viram um homem caminhando pelas ruas do condomínio. Não se é mais seguro em lugar nenhum do mundo e enquanto seu pai não voltar do Rio de Janeiro, você deve me ajudar a cuidar da sua irmã.
- Claro mãe. - Desde de que completara 19 anos sua relação com a mãe baseava-se em monólogos e respostas monossilábicas, não porque tivessem algum problema, mas Bruna era uma garota fechada.
- Eu sei me cuidar mãe, não preciso da Bruna me vigiando todo o tempo. - Natalie sua irmã mais nova falava para a mãe - Tenho 15 anos, já sei me virar.
A mãe sorriu e o café seguiu por mais alguns minutos até que Bruna e a irmã se arrumaram e caminharam até a praia. Ela deixou Natalie tomando sol e sentou em uns bancos de pedra mais perto da água. Fechou os olhos, gostava de sentir o vento esvoaçando seus longos cabelos loiros, gostava de imaginar que seus olhos azuis um dia seriam tão profundos quanto o mar que ela ouvia.
- É um belo lugar não acha? - Uma voz masculina surgiu atrás dela, ela se espantou de início, mas ao virar para ver o dono da voz ficou pálida. - Era o homem que a havia salvado na noite anterior, mas ele já não exibia asas, só o mesmo jeans rasgado e a camiseta branca, com alguns respingos de sangue.
- Você... É você!
- Sim, sou eu. Posso me sentar? Estou um pouco cansado, você me deu muito trabalho ontem a noite garota. - O rapaz sentou-se ao lado dela no banco e esticou as costas, parecia brutalmente cansado.
- Quem é você? O que é você? Como isso tudo pode ser real? - As perguntas saíam rápidas como disparos de balas e o jovem sorriu tentando acalmar a garota.
- Já tive muitos nomes, mas pode me chamar pelo nome que meu Pai me deu. Me chame de Joaquim... Quanto às outras perguntas vamos com calma, creio que você sabe a resposta de algumas.
- Eu sei as respostas? Você está louco?
- Acredite no que viu ontem, nada daquilo foi um sonho, não lute contra isso, deixe que a percepção domine você. Você é uma agente da natureza, deveria lidar melhor com essas coisas.
- Está me pedindo pra lidar com um homem com asas, uma mulher que surge das sombras e um lobo demoníaco? Meus rituais são bem mais simples, acredite e nem um pouco perigosos se comparados a ter seu coração arrancado por uma sombra! - Ela perdia o controle da respiração novamente.
- Lilith e Hati não a incomodarão mais, fique tranquila, para eles você está morta. Hati pelo menos não vai mais incomodar você, nem ninguém mais.
- Você o matou?
- Definitivamente.
- Ainda não me disse quem é. - Ela tentava organizar os pensamentos
- O nome não é suficiente? - Joaquim dava respostas evasivas.
Ela olhou para ele e de certa forma sentiu que seus olhos azuis causaram um impacto nele, porque ele novamente deu um sorriso de canto de boca.
- Ok. Eu sou um anjo, ou costumava ser, depende do ponto de vista.
- Como costumava ser?
- Você morreu ontem a noite garota. A mulher foi embora porque retirou de você o que ela queria, sua energia vital. O único jeito de impedir que você morresse era compartilhando com você a minha própria essência, foi o que eu fiz, mas isso tem suas desvantagens.
- Quer dizer que eu sou um anjo agora? - Ela perguntou pra ele um tanto incrédula
Dessa vez Joaquim deu uma gargalhada bem alto.
- Não, claro que não. Significa que você tem a minha essência, mas se sonha em ter asas, sinto desapontar você.
- Isso não deveria tirar sua vida?
Ele sorriu mais uma vez.
- Isso apenas me atrasou, mas era necessário que você continuasse viva.
- Por que?
- Uma longa história que não vou contar agora, mas... Uma grande guerra está por vir e os sinais estão por toda a parte. É importante que você esteja viva, porque você tem um papel muito importante nas batalhas que estão por vir. Me faça um favor? Mantenha-se viva e venha me buscar.
- Buscar você? Mas você está bem diante de mim. - Ela ficava confusa cada vez mais.
- Você ainda tem muito a aprender... Mas me faça esse favor, apareça amanhã à noite em um pequeno chalé, no caminho para Rio das Ostras, peça a uma idosa para me ver. Ela já foi avisada não se preocupe. E a propósito, traga biscoitos e refrigerantes, se possível um hamburguer. Estou precisando de alimentos calóricos.
- Mas de que merda você está falando? - Ela se exaltou.
- Bruna! Bruna! - Natalie estava gritando ao longe, mas ao se virar pode ver que ela estava bem ao seu lado.
- Natalie? Mas de onde você veio? Como surgiu aqui do nada?
- Do nada? Já estou te chamando há quase uma hora. Você parecia em transe. Aquelas bruxas andam te dando alguma droga não é? - Natalie sorriu, por mais que Bruna explicasse que não eram bruxas, Natalie e sua mãe jamais entenderiam.
- Primeiro não somos bruxas, segundo isso é impossível, acabei de me sentar aqui!
- Você está muito estranha, já estava há uns 40 minutos falando sozinha.
- Sozinha? Mas tem um amigo aqui bem do meu... - Ao se virar para mostrar Joaquim ela reparou que estava sozinha. Será que ela estaria louca? Será que havia sido mais um sonho?
- Vamos, mamãe está nos esperando pro almoço, sua doida.
Elas levantaram e começaram a caminhar de volta para casa. O mundo girando ao redor de Bruna, tantas perguntas e nenhuma resposta, mas as palavras de Joaquim ecoavam em sua mente. "Acredite no que viu ontem, nada daquilo foi um sonho, não lute contra isso, deixe que a percepção domine você." Na noite seguinte ela estava decidida a ir até o chalé, precisava acreditar que aquilo era real, pois do contrário o próximo passo seria procurar um psiquiatra.













Continua..............................................................

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Cap.1 - Let´s Kill Tonight

A chuva tamborilava nas árvores e ruas de um condomínio residencial localizado em Unamar, distrito do município de Cabo Frio. Era alta temporada e a chuva atrapalhava os planos de turistas que vinham à região em busca de praias, trilhas, festas bem como frustrava os lucros de muitos comerciantes. O condomínio residencial, um dos mais conhecidos da região permanecia cheio, havia uma quantidade considerada de moradores se comparada a de turistas que alugavam casas por ali o que dava ao lugar um aspecto familiar e aconchegante.
Mas aquela noite era diferente... Já passavam das 3 da manhã, uma pequena neblina descia sobre as árvores atrapalhando a visão das estrelas e da própria lua. Um silêncio mortal reinava sobre as trevas envoltas em neblina. Era um fato completamente fora do comum encontrar neblina aliada à chuva, principalmente a 300 metros da beira da praia.
Passos apressados singravam as pequenas poças formadas pelas ruas do condomínio, uma garota arfava e corria, desesperada, o suor misturado às lágrimas que escorriam pelo rosto. Era a própria face do desespero, tentava gritar mas parecia que nenhum som brotava do fundo de sua garganta, ela sabia que encontraria seu fim antes mesmo de o sol aparecer no horizonte, mas ainda assim corria agarrando-se ao único fio de esperança que a mantinha de pé. Se conseguisse chegar em casa estaria segura, pelo menos era o que pensava, era no que precisava acreditar.
Atrás dela uma figura medonha corria em sua direção, a forma da besta lembrava um lobo, mas concerteza muito maior do que qualquer espécie já vista na terra. O lobo abria a boca e exibia os dentes afiados, prontos para dilacerar a carne da garota assim que alcançasse. Ele se apresentava de tal forma que parecia estar sorrindo, satisfação no medo da garota, no seu despero, em sua dor.
A garota estava chegando em casa, mais 20 metros e poderia abrir sua porta, fechar-se em casa e encerrar aquele pesadelo. O lobo aumentou o ritmo de suas passadas, a saliva escorrendo pelos cantos da boca daquela figura demoníaca. A garota podia sentir o bafo quente do lobo em sua nuca, se ela parasse por um momento, se vacilasse, era o fim.
O lobo deu um salto sobre a menina, ela conseguiu livrar-se por muito pouco da investida, mas com a distração tropeçou em pequeno buraco na rua formado pela chuva e caiu. Tentou se levantar na mesma hora, sentia o sangue escorrendo em filetes bem finos por seus cotovelos.
O lobo veio avançando devagar em sua direção, paciente, calmo, saboreando cada momento, imaginando o sabor que a carne da garota teria entre seus dentes. Ele uivou. O uivo fez a menina tremer, fez as janelas da vizinhança tremer, mas nem sinal de vida de seus vizinhos. Pareciam alheios a tudo que ocorria com ela, era impossível não ouvir.
- Deus... - Ela falou entre os dentes - Por favor... Me ajude.
- Temo que seu Deus não possa ouvi-la menina, se nem mesmo seus vizinhos escutam seus gritos de terror, acha mesmo que Ele vai dar alguma atenção a você? - A voz surgia atrás dela, as sombras que pareciam cobrir a árvore na beirada da calçada tomava forma, se materializava no corpo de uma mulher. Ela trajava um corpete negro e uma calça que terminava em botas de couro negro. No lugar dos olhos, pareciam haver sombras e aquilo só serviu para deixá-la em um estado de terror ainda mais profundo.
- Quem... O que são vocês? O que querem de mim? Por que me perseguem? Não tenho dinheiro se é o que querem... - Ela suplicava, as lágrimas já escorriam pelo seu rosto sem ela perceber, o ar lhe faltava, em breve teria um colapso.
- O que quero de você é bem mais valioso garota, venho atrás da mais cara das moedas - A mulher se agachou ao lado da garota e passou o dedo pelo braço dela, recolhendo uma pequena gota de sangue e levando ela aos lábios exibindo uma terrível cara de prazer. - Venho em busca da sua alma.
- O que? Por que? O que eu fiz? Quem são vocês?
- Isso não interessa mais a você, porque em breve já não vai precisar dessas respostas.
A mulher levou a mão ao coração da menina, forçando uma abertura, rasgando a carne, fazendo a garota se retorcer de dor, gritar, mas inutilmente pois ninguém a ouviria. A mão da mulher já sentia a carne pulsando e o sangue jorrando e tudo lhe dava ainda mais prazer.
- Solte a wicca agora, Lilith. - A voz surgiu como um trovão atrás dela.
Ela girou a cabeça e a figura de pé atrás dela lhe causou medo, retirou de seu rosto todo o prazer que antes estava estampado. Um homem alto, corpulento, aparentava não ter mais de 25 anos, exibia uma barba rala e cabelos negros que moldavam o rosto fino do rapaz. De suas costas saía um par de asas brancas como a neve, onde nas pontas reluziam como o metal. Usava uma camiseta branca e um jeans surrado, em uma das mãos segurava uma espada longa, como as da idade média, mas com uma diferença, essa espada reluzia como uma chama de fogo. Na outra mão segurava uma pequena pistola, uma beretta.
- Não me faça repetir, Lilith. - Ele falou mais uma vez e tudo indicava que seria a última.
Lilith sorriu e sibilou para o lobo que estava um pouco distante dela:
- Ataque Hati, preciso de mais alguns minutos para poder retirar toda a essência da pequena bruxinha aqui... Ela é resistente.
O lobo obedeceu partindo em direção ao guerreiro, saltando em sau direção, as garras prontas para despedaçar o que encontrasse. O guerreiro desviou do primeiro ataque e disparou a arma na direção do animal. Tinham oito balas no tambor, mas a perícia e a maestria com que atirava era tão perfeita que conseguiu cravar as oito balas no corpo do lobo. Mas Hati ainda estava de pé, sangrava, mas a fúria em seu olhar só parecia ter aumentado, os olhos agora vermelhos de fúria, anunciavam um novo ataque, o lobo tentou fixar sua posição antes da nova corrida, as balas perfuraram sua carne, mas não seriam o suficiente para derrubá-lo.
O guerreiro jogou a arma no chão e preparou sua guarda para atacar o lobo com a espada flamejante. Hati partiu na direção do guerreiro, as garras novamente em riste, despejando sucessivos golpes em cima do guerreiro alado. Mas o guerreiro desviava do ataque e tentava o contra ataque, mas o lobo era rápido, não abrindo brechas para o guerreiro fincar sua espada e decepar a cabeça do lobo. Mas ao mesmo tempo Lilith ia sugando a essência da menina para fora do seu corpo e se aquela luta se prolongasse todo aquele esforço seira em vão.
Em um movimento rápido, Hati atacou, mas o guerreiro se desviou, ele girou o corpo ficando de frente para a lateral do corpo da fera, Hati não foi rápido o suficiente e a espada flamejante desceu sobre a cabeça do lobo. O corpo inerte desabou no chão enquanto a cabeça rolava para o gramado de um dos vizinhos.
O guerreiro caminhou na direção de Lilith e da garota, mas era inútil, o corpo inerte era jogado no chão enquanto Lilith se erguia, um sorriso demoníaco desenhado nos lábios. Ela sorriu uma última vez e como uma brisa desapareceu nas trevas, mesclando-se a elas.
O guerreiro se ajoelhou dante do corpo da menina, aquela cena era triste até mesmo para um anjo. Ele repousou sua mão sobre o peito da menina e fez uma pequena prece, a mão se iluminou e era como se um pequeno sol surgisse no meio da rua. Ele estava fazendo uma transfusão, estava trocando sua vida pela da garota, estava dando a ela sua essência.














Continua...............................................